segunda-feira, março 8

Sonhos

"Obrigada por teres assombrado as minhas noites, as minhas memórias. Não sei nada de ti, mas tenho te respeito. Porque me disseram que morreste! Que sofreram por ti, porque eras perfeito. E eu nunca te pude conhecer. Estive mais preocupada com as minhas intrigas pessoais, que quando partiste, não liguei. Desculpa-me, mas perdi o teu nome no tempo. Gastei a minha raiva num amor que nunca consegui ter e tu sim. Mas agora tu... Voltaste? Ou morri eu? Mataram-me...? Creio que não senti dor. Não como tu hás de ter sentido. Eu..."

"... Aterrorizei os teus sonhos, tapei-te os olhos, poupei-te a ainda mais vergonha. Mas voltei para que soubesses que só se morre na cabeça das pessoas, não no coração. Não queiras matar alguém que, sendo menos que tu, não podes matar. Não por vingança pessoal. Ninguém tem o que merece, e na altura, ela não há-de merece-lo."

"Mas está morta. Na minha alma. Nas nossas almas. Ela levou o meu amor e levou-me com ela. Arrancou-me o que tinha cá dentro, e deixou-me... Aqui. Encheu-me de esperanças, e tirou-me o ar, como se de um balão eu me tratasse. Chorei montes e vales, mas tenho ainda vivas cada uma das memórias que me fez ama-la. Que desejo! O cheiro a ópio nos cabelos negros e sedosos... Agora vieste tu, com as tuas cores, manchar a minha beleza vestida das cores da noite. Das cores da morte. Como te atreves?"

"..."

"Como te atreves, diz-me? A entrares na minha vida sem autorização, sem me conheceres, sem me respeitares, sem poderes perdoar-me, sem poderes falar-me! Mas encheste o que ainda guardava só de meu, o que me sobrou. O pouco triste e roto que foi consumido por sentimentos menos nobres, por vontades maiores. Porque me fazes ter medo e gritar outra vez? Que me queres dizer que eu não entendo?" - gritava-lhe tentando agarrar-lhe o casaco que vira em fotografias. Tinha medo que fosse real. - "Tenho vómitos, e os olhos pesados, mas não consigo dormir com medo que apareças e me atormentes. Tu, que nem te conheço. Que perdi o teu nome. Que lutaste uma batalha que não era a minha, e que agora tenho de sofrer por ela! Afasta-te! Vai-te! Leva contigo o meu amor e dá-me paz. Não me contes como foi, nem quanto sofreste. Leva o meu amor por ela, e encontra noutro lado a felicidade. Não quero mais pensar em esconder sentimentos, matar amores, sofrer horrores que a carne nunca poderá vir a entender. VAI-TE! PÁRA DE ME ATORMENTAR E HORRORIZAR! DEIXA-ME VIVER! DEIXA-ME! DEIXA-ME! DEIXA-ME!"


Nisto acordei. Acordei de um sono profundo. Sei muito bem quem tinha visto, embora não me lembre do nome, mas sei. Faltavam poucos dias, e a loucura que sentia dentro de mim, era apenas desejo ardente de vislumbrar a perfeição vestida de negro. Paixão intensa de a ter nos braços pela última vez, e ama-la para sempre. Para sempre ser minha. Vontade que me matava por dentro, de sentir os lábios doces e suaves, flocos de neve puros, banhados de vermelho. Sentia-me a arder. A arder de sentimentos, de memórias. Sentia o meu amor a arder, e a restarem apenas cinzas inundadas de raiva...